quinta-feira, 1 de outubro de 2020

O PROBLEMA DO DÍZIMO

 



De todas as doutrinas cristãs, o dízimo, sem dúvida, é uma das mais mal interpretadas, polêmicas e combatidas. Para os não cristãos, o costume de dizimar é uma prova cabal de como os crentes são simplórios e manipuláveis, e os pastores e sacerdotes, exploradores e gananciosos. Mesmo entre os cristãos, a doutrina do dízimo é muitas vezes mal compreendida ou mesmo rejeitada, e é fato que uma grande parte dos cristãos do mundo não chega a dizimar de forma consistente, já que, se todos assim o fizessem, a realidade das organizações cristãs seria muito diferente do que é hoje. 

Para tentar trazer um pouco de luz sobre esse assunto, separei os motivos que levam as pessoas a não dizimar (ou então a dizimar sem saber o motivo, que é um problema tão grande quanto) em três grupos, que são:

MOTIVO 1: NÃO ENCONTRO RESPALDO BÍBLICO – É preciso admitir: o Novo Testamento, sobre o qual baseamos nossa fé, não traz um sentido claro a respeito de dar o dízimo. Não existe UM SÓ VERSÍCULO neotestamentário dizendo “deveis entregar o dízimo”, “ou entregareis o dízimo”. O máximo que temos é um comentário de Jesus a respeito dessa prática, em que ele reconhece que os fariseus entregavam o dízimo mas não realizavam a parte “mais importante da lei”. “Deveis fazer estas coisas, sem omitir aquelas”. E é só. Mas ele estava conversando com judeus, pessoas debaixo da Lei de Moisés. Nas cartas, que são as orientações claras para a Igreja de Cristo (baseadas não mais nas leis mosaicas, mas na nova Lei do Espírito, a Lei do Amor), um total de ZERO menções à obrigatoriedade da entrega do Dízimo. Assim, um cristão que se dedica a seguir o novo testamento e rejeita judaísmos tem um belo argumento para não dizimar, com a mesma consciência tranquila de quem não guarda o sábado ou come um belo prato de feijoada. 

MOTIVO 2: NÃO VEJO SENTIDO – Vamos encarar: o costume de dar o dízimo não faz o menor sentido do ponto de vista da mente racional. Qual o motivo de abrir mão de 10% dos meus ganhos, para o resto da vida, sem saber bem o que estou recebendo em troca? Se a gente for pensar bem, é pior que um Plano de Capitalização, desses bem picaretas, porque não conseguimos nem resgatar o valor investido. É um dinheiro que não é guardado, nem separado, nem investido, e que de fato não sabemos bem pra onde está indo. Além disso, a maneira como alguns líderes ensinam sobre o dízimo é no mínimo suspeita: além de fazer ameaças veladas (algumas vezes, nem tão veladas) sobre os riscos de não dizimar, o que inclui até a estranha figura do “Devorador” (que pode ser a farmácia, a oficina mecânica, o hospital, ou seja, qualquer gasto imprevisto no mês), também incluem promessas que parecem um tanto quanto suspeitas, como cancelamento de dívidas e aumentos milagrosos de patrimônio. Precisamos admitir que convencer alguém a lhe dar dinheiro em troca de uma promessa vaga de prosperidade e sob uma ameaça ainda mais vaga de perda financeira parece DEMAIS com estelionato. 

MOTIVO 3: NÃO QUERO – Esse motivo talvez seja o principal, porque muitas vezes é a razão por trás dos outros dois. Muitas vezes temos dificuldades para encontrar sentido em fazer algo ou então encontramos diversas razões teológicas para deixar de fazê-lo simplesmente porque NÃO QUEREMOS. Esse também pode ser encarado como o principal motivo porque diz respeito a questões de Fé, Identidade e Revelação de Deus. Ou seja, as partes mais importantes da vida de cada cristão. Quando Jesus alerta sobre a impossibilidade de servir a dois senhores, em seguida ele já estabelece que nossas opções se resumem a duas: ou servimos a Deus ou ao Dinheiro (Mamon, no original). De tantas coisas que podem escravizar e mesmo ter senhorio sobre o homem (vícios, sexo, demônios) Jesus fez questão de estabelecer o Dinheiro como sendo a opção principal, como se fosse uma espécie de anti-Deus, e isso parece fazer eco com outras declarações de Jesus ao longo dos evangelhos, como quando ele diz que é mais difícil passar um camelo pelo fundo de uma agulha do que um rico entrar no Reino dos Céus. Ele não falou que era “impossível aos homens” que um estuprador, um pedófilo, um satanista ou um serial-killer fossem salvos, mas colocou os ricos nessa categoria, o que chocou imediatamente os discípulos. De fato, até os dias de hoje, ficamos mais impactados com um criminoso que é transformado pelo Evangelho do que com um milionário que começa a frequentar uma igreja. Aparentemente, para Jesus, o segundo caso é bem mais impressionante. Uau! E por que isso? Certamente não existe nada de sobrenatural no dinheiro, seja ele papel ou números na tela de um celular. Mas o fato é que ele exerce um papel sobre a totalidade da vida dos indivíduos, e uma maneira de verificar se a pessoa de fato aceitou o senhorio de Jesus em sua vida é ver como ela lida com as questões financeiras. Não é a toa que o jovem rico dos evangelhos abriu mão da salvação por não querer deixar suas “muitas riquezas” (e olha que ele o fez com tristeza, ou seja, sua vontade não era mais dele, estava totalmente vendida ao deus Mamom), e também não é por acaso que Jesus afirma a salvação de Zaqueu no momento em que este decide doar parte de sua fortuna e ressarcir financeiramente aqueles que havia prejudicado. Nesses dois momentos foi possível ver quais escolhas haviam sido feitas, com resultados eternos.

Apresentadas as principais razões contrárias ao Dízimo, gostaria agora de analisar cada um desses itens separadamente, apresentando alguns argumentos de que devemos, sim, dizimar. Ou melhor dizendo, que dizimar não é uma coisa sem sentido, imposta por homens gananciosos para nos explorar e nos fazer mais pobres. Pelo contrário, é uma ideia de Deus, respaldada pelo Novo Testamento e que, ao ser praticada, não apenas nos traz bênçãos financeiras, como ainda nos ajuda a entrar em um outro nível de relacionamento com o Pai.

MOTIVO 1: EXISTE RESPALDO BÍBLICO SIM – Uma vez, tive que preparar um estudo aprofundado sobre dízimos. Já tinha o esquema na minha cabeça: iria falar do primeiro registro de alguém entregando o dízimo na Bíblia, no caso Abraão (que ainda se chamava Abrão), o Pai da Fé, no livro de Gênesis. Em seguida, falaria do Dízimo como ensinado na Lei de Moisés e praticado em todo o período anterior a Cristo. E, por fim, explicaria que esse é um costume que devemos continuar praticando porque, se Jesus aboliu a Lei Mosaica, ele não tocou no que vinha antes dela, como se o Dízimo fosse algo tão básico que fosse natural ao homem ministrar a Deus através dele. Assim, o estudo iria se chamar “O DÍZIMO ANTES DA LEI – O DÍZIMO NA LEI – O DÍZIMO APÓS A LEI”. Sim, é um título grande e ruim, mas a ideia geral seria essa. Seria, porque, quando li Hebreus, para entender mais a respeito de Melquisedeque, o “sacerdote do Deus Altíssimo” que recebeu os dízimos de Abraão, fui confrontado com o seguinte versículo: “Pode-se até dizer que Levi, que recebe os dízimos, entregou-os por meio de Abraão, pois, quando Melquisedeque se encontrou com Abraão, Levi ainda estava no corpo do seu antepassado” - Hebreus 7:9,10  . O que o escritor aos Hebreus está dizendo é que, como Isaque, filho de Abraão e avô de Levi (de quem veio a tribo levita, responsável pelo recolhimento dos dízimos dos israelitas), ainda não havia nascido no momento em que o dízimo foi entregue, ele de certa forma ainda estava “dentro” do pai, e que, portanto, ele também havia participado da entrega dos dízimos. Assim, o meu título já tinha que ser alterado, já que a Bíblia afirmava que TODO o dízimo entregue debaixo da Lei havia sido, simbolicamente, também entregue por Abrão. “O DÍZIMO ANTES DE CRISTO – O DÍZIMO DEPOIS DE CRISTO” poderia ser um título mais apropriado. Poderia, mas não pôde, porque o autor de Hebreus continuava o raciocínio, dizendo que Melquisedeque não era apenas um personagem obscuro do Velho Testamento, mas também um tipo de Cristo. Ele chega a citar um salmo messiânico, o de número 110, que afirma com todas as letras hebraicas a respeito de Jesus: “Tu és sacerdote para sempre, segundo a ordem de Melquisedeque". TODOS os dízimos entregues sob a Lei não apenas haviam sido entregues POR ABRAÃO, mas também haviam sido, de certa forma, entregues PARA JESUS, que exerce hoje o mesmo sacerdócio de Melquisedeque, um sacerdócio superior ao levítico, em todos os sentidos. O meu estudo original havia ido por água abaixo, mas o mais importante é que eu entendi que não fazia sentido dividir o Dízimo em períodos ou fases: o Dízimo sempre foi o mesmo, antes e depois da Lei, antes e depois de Cristo. A diferença é que a Igreja, hoje, pode praticá-lo com o entendimento totalmente iluminado: os dízimos não são entregues nem para sacerdotes misteriosos nem para os descendentes de Levi, mas para o próprio Deus, Jesus Cristo, que o recebe através do Seu Corpo, a Igreja.  

MOTIVO 2: NÃO FAZ SENTIDO, E POR ISSO É IMPORTANTE – Realmente, não faz sentido. E esse é mais um motivo pra praticar. Uma pessoa de Fé não é guiada pelos sentidos físicos e raciocínios, mas pelo que crê. Não anda por vista, mas por Fé. Existem centenas de razões muito boas para não entregar o dízimo (não sei para onde vai, não tenho certeza da índole do meu pastor, prefiro administrar eu mesmo, vai fazer falta no meu orçamento) e apenas uma para entregá-lo (a Bíblia assim ensina). E essa é a GRANDE razão para adotarmos essa prática. Dizimar é considerar a situação econômica do país, as contas, os imprevistos, o orçamento familiar, e ao mesmo tempo declarar que existe uma realidade superior, uma que supera as circunstâncias financeiras imediatas e nos garante suprimento abundante em todo o tempo e em cada situação. Não existe, na Bíblia, nada comparado com a promessa associada à entrega dos Dízimos. Deus chega a nos desafiar claramente: “Ponham-me à prova [me provem, me testem] se [ao entregarem os dízimos] eu não abrir as comportas dos céus e derramar sobre vocês tantas bênçãos que nem terão onde guardá-las” (Malaquias 3:10). É uma promessa e um desafio, de que um ato de fé (a entrega dos dízimos) será seguido pela chegada da provisão. E é uma promessa que vale pra nós hoje, já que vimos, no item anterior, que o Dízimo do Velho Testamento é o mesmo que ainda entregamos. Afinal, em Cristo temos o “sim e o amém” para cada promessa da Antiga Aliança. 

MOTIVO 3: A CARNE NÃO QUER, MAS SOMOS GUIADOS PELO ESPÍRITO – Nos tornamos novas criaturas no momento em que cremos no Sacrifício e na Ressurreição de Jesus e confessamos que Ele é o único Senhor de nossas vidas. Único. Senhor. Não existe como ter um relacionamento verdadeiro com Cristo sem tê-lo como a coisa mais importante. Não é possível servir a dois senhores. “Deus ou o Dinheiro” é uma escolha que temos que fazer todos os dias. O que move minhas decisões? Ganhos financeiros ou fazer a vontade do Pai? Se Jesus é de fato nosso Senhor, isso quer dizer que não temos mais vontade independente da Dele. Talvez por isso Mamom seja tão perigoso pra nossa vida. Ter dinheiro dá uma ilusão de completa liberdade, de fazer o que quiser sem ter que dar satisfações. “Ninguém paga minhas contas”, dizem alguns, quando afirmam que não precisam se submeter às opiniões dos outros. O dinheiro dá ilusão de independência, autossuficiência, poder. Afinal, se Mamom é um deus pra este mundo, o que é um homem muito rico? Um sacerdote, um profeta? Um “deusinho”? É por isso que é tão importante romper com esse deus para se comprometer com o Deus verdadeiro. Por isso a exigência de Jesus para o jovem rico, “vá, venda tudo o que tem, dê o dinheiro aos pobres e terá um tesouro nos céus. DEPOIS, venha e siga-me”. Dizimar faz parte desse processo. É declarar, pros céus e pro inferno, quem é nosso verdadeiro Senhor. Se Mamom é um deus, quando dizimamos estamos demonstrando que ele não é o NOSSO deus. Quando somos fiéis e confiamos em Deus na área financeira, damos a Ele liberdade para se mover nas outras áreas de nossa vida. Dizimar com conhecimento é um aspecto importante do crescimento da nossa intimidade com o Pai.

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